quarta-feira, 27 de abril de 2011

Liberdade religiosa x Direito à vida: Comentários acerca transfusão de sangue dos adeptos da testemunha de Jeová.



Vale uma análise sobre a questão da transfusão de sangue aos adeptos da testemunha de Jeová. Como muitos sabem, os seguidores não aceitam a transfusão de sangue. Daí vem a pergunta: Quais as possíveis implicações jurídicas sobre o assunto?
Mas antes vale um breve comentário no que tange a liberdade religiosa garantida no nosso país.
Conforme preconiza a nossa Constituição Federal, ninguém poderá ser privado por motivo de crença religiosa [...], ou seja, o Estado brasileiro é laico, caracterizado por não adotar uma religião oficial. Com isso, está assegurado a crença religiosa de maneira ampla, plena. Então, todos podem seguir qualquer religião, podem também mudar de religião, ou não seguir nenhuma, garantindo também a possibilidade de ser ateu.
A partir daí, podemos vislumbrar uma hipótese já bem conhecida, que é o caso de uma criança que necessita de uma intervenção cirúrgica e, conseqüentemente, de uma transfusão de sangue. Os pais, adeptos da testemunha de Jeová, diante da situação, não aceitam que o seu filho receba o sangue de outra pessoa. Como a criança corre risco de vida, qual seria a melhor opção a ser tomada pelo médico?
Juridicamente, quando estamos diante de dois ou mais direitos tutelados, gerando uma espécie de “conflito”, deverá ocorrer a ponderação dos interesses, no caso em tela, entre o direito à liberdade religiosa e o direito à vida. Sem dúvidas prevalecerá o direito à vida, embora não seja absoluto, é maior bem tutelado pela nossa Constituição. Isso responde a pergunta que fizemos anteriormente “qual seria a melhor opção a ser tomada pelo médico?”, logicamente, diante da urgência, o médico DEVERÁ (não é uma opção, mas sim uma obrigação) proceder com a transfusão de sangue, pois caso não o faça, poderá ser responsabilizado criminalmente por homicídio doloso.
Destaco também o que determina o Código de Ética da Medicina (Resolução CFM nº 1.246/88), vejamos:

É vedado ao médico:
“Art. 46 - Efetuar qualquer procedimento médico sem o esclarecimento e consentimento prévios do paciente ou de seu responsável legal, salvo iminente perigo de vida”.


Como podemos ver, o Código de Ética da Medicina na parte final do art. 46, põe a salvo a autonomia dos médicos nos casos de iminente perigo de vida, no qual deverá utilizar todos os meios disponíveis para salvar a vida dos pacientes.
Vale ressaltar que, os pais ou o responsável legal, ao impedir a transfusão de sangue, também poderão responder por homicídio doloso.
Em 2010 a 12ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul autorizou uma mulher testemunha de Jeová a deixar de receber transfusão de sangue. Os médicos orientaram que a não submissão ao procedimento de transfusão de sangue, poderia ter risco de morte, porém, mesmo após as orientações médicas a paciente disse que "a transfusão de sangue é procedimento incompatível com suas convicções religiosas". Em primeira instância, a decisão foi no sentido de que o hospital fizesse a transfusão, mas ela recorreu e o TJRS autorizou que ela não se submetesse ao procedimento. Segundo o desembargador Cláudio Baldino Maciel, relator da decisão, "o Estado não pode autorizar determinada e específica intervenção médica em uma paciente que expressamente não aceite, por motivo de fé religiosa". Um ponto a ser destacado nesse caso, é que o risco de morte NÃO era iminente, mas possível, se ele não fizesse o tratamento indicado. Mas se o risco fosse iminente, o médico deverá proceder com a transfusão de sangue sem a intervenção judicial, pois é sua obrigação legal e ética a proteção da vida.

Texto: Marlon Nunes

6 comentários:

  1. Otimo texto Marlon, acredito que muitos ao terem ciencia da decisao do Desembargador Cláudio o tenham criticado, pois ao fazer a ponderaçao ele optou pela liberdade religiosa, seria uma boa ideia de se fazer uma uniformizaçao de jurisprudencia em sede de Tj ou até mesmo no STF( sendo vinc ou ñ) pois afinal é de matéria Constitucional que se trata, mas isso o FUTURO DIRÁ ,
    Parabéns e Sucesso no Blog

    ResponderExcluir
  2. Não creio em êxito quando se mistura Direito à religião. É complicado por demais. Entretanto vislumbrar não prosseguir com determinado procedimento médico com o intuito até mesmo de salvar a vida por questões de crença, não acredito que seja uma saída ética. Deus prega e é a própria vida em si. E se nós temos oportunidades de preservá-la e salvá-la, é porque Ele quis assim.
    Parabéns pelo post!
    http://critico-estado.blogspot.com

    ResponderExcluir
  3. Estou fazendo um TCC sobre isto. O Testemunha de Jeová que se nega a receber sangue não está renunciando o direito a vida e nem querendo morrer. Ninguém quer morrer!!

    Este, na minha opinião, é um ponto chave.

    ResponderExcluir
  4. Parabéns pelo texto. E muito informativo seu blog, tanto para a sociedade como para nós do meio jurídico.
    Vou publicar seu texto no meu blog, tudo bem?

    Lucimara Deretti
    http://www.advogadalucimara.blogspot.com/

    ResponderExcluir
  5. Só não consegui seguir teu blog, não está aparecendo o link.

    ResponderExcluir
  6. Amigos, obrigado pelos comentários... É sempre bom discutir e opinar sobre os assuntos relevantes para a sociedade. Assim que puder, eu irei postar novos textos.

    Um abraço

    ResponderExcluir